quinta-feira, dezembro 07, 2006

Poesia

Criação Poética

Não há criação sem criador
Não há agência sem agente
Não há nada que seja só
Fruto da passividade da gente

Não há ideia sem pensador
Não há ímpeto sem vontade
O mundo é só o que vemos
Uma mentira na verdade

A obra do pedreiro
Não depende do arquitecto?
A pessoa que é hoje
Não nasceu de um afecto?

O poema não é só ele
É fruto de quem o sonhou
Existiria sozinho sem a pena
Que ao papel o colou?

Triste de quem assim pensa
Acredita no destino restrito
De que em cada santo dia
Só se faz o que está escrito

O objecto só o é
Na relação com o sujeito
Sem matéria de sonho alto
Nada se faz, nada é desfeito

Eu não me calo
(pois que me calem!)
Eu não desisto
(pois que me amarrem!)

Não há obra que seja
Que a um plano não obedeça
Todo o corpo – sem excepção
É comandado por uma cabeça

João Tavares



Sugestão

Sou duma raça de Heróis do Mar
Imortais na sua valentia e nobreza
Sou patrício dos que deram novos mundos ao mundo
Dos que uniram continentes e difundiram Portugal
Sou herdeiro duma tradição de Império secular
Duma cultura inclusiva e globalizante
Ensinaram-me a ter orgulho na Pátria
Que é os restos do que já foi
Enfiaram-me pelos ouvidos dentro
O fado que se canta
E enfiaram-me pelos valores dentro
O fado de cada dia que se chora
Por já não sermos o que fomos
Se é que alguma vez o fomos
Se é que o povo alguma vez
Foi o grande fazedor de grandes coisas
De grandes feitos (ou defeitos?)
Se sou o herdeiro duma tradição de Império secular
Então onde estão a coragem e a iniciativa
Que fizeram desta praia sossegada e periférica
O maior porto de comércio e movimento de Outrora?
Onde se esconde o espírito aventureiro
E empreendedor dos Maiores do nosso orgulho?
Porque é que preferimos ficar pr’aqui a chorar
O que já nem temos lágrimas para chorar?
Sim, sou herdeiro
Mas não sou herdeiro de nada que eu próprio não construa para mim
Não sou herdeiro de nada que eu mesmo não queira herdar
Se me querem pobre e coitadinho a chorar por D. Sebastião
Então façam-me uma lobotomia e prendam-me pelos pulsos
A uma qualquer casa de fados
Cheia de carpideiras profissionais
Das Artes e da História
Mas se me querem herdeiro a sério e a valer do que é Ser Português
Então sejam-no comigo
Arregacem as mangas
E partamos todos juntos para a conquista de um novo esplendor
Radioso e glorioso
Fruto de suor e vontade
Queiram fazê-lo e fá-lo-emos
Soltem as amarras, icem as velas, encham o peito
Vamos a isso
Sejamos patriotas no ser sérios e ter vontade
No ser pontuais e ter brio no trabalho
No dar o exemplo e cumprir objectivos
No ousar ser melhor e ir mais além
Sejamos merecedores do nosso passado
Sendo melhores no nosso futuro – agora!

João Tavares