domingo, junho 10, 2007

Poesia I

ODE SINUSOIDAL


Latente contracção de esponjas amarelecidas

Pelo vento, pelo tempo, pelo sustento

Que me lambe as feridas das mãos

Que eu fiz ao saltar os muros com arame farpado

Do sonho de ser mais alto.

Mórbidas insolações de Inverno em dias de chuva

Arrastam carrascas lembranças do futuro

Que nunca tive nem nunca hei-de saber.

Inútil! És um inútil, sonho!

Serves só para não servir para nada!

Banhas com banhas de cobra as cobras que não se banham!

E não passas de um inútil…

Deita-te ao ar de almofadas em punho

A ver se alguma dispara na direcção errada

De voltar para trás indo seja lá para onde for

Sim, seja lá para onde for,

Que ir para qualquer lado

É sempre ir na direcção errada.

Bandeiras olfactivas de peixe podre

E odorizantes matinais perenes

É disso que se queixa a multidão amordaçada?

Soubesse a multidão que é multidão sequer!

E já não se queixavam de mais nada…

Vai-te embora daqui para fora

Ou fica lá longe do outro lado de ti…

Cortei-me outra vez pela primeira vez

Isto está sempre a acontecer

E já nem sei que bolso hei-de usar para pôr lá dentro

Os dentes partidos que me vão cair

Quando me esmurrarem amanhã de manhã

Ou de madrugada

Ou de noite

Ou de comboio

Ou de bicicleta

Desde que não seja com borboletas da Antártida.

É sempre assim que o mundo se diverte

Atira caixas contra a parede do riso

E espera que os vampiros da saudade

Se vão refastelar a seguir

Completamente imundos e a pingar sangue pelas narinas.

Já percebi…

Estou doido…

Não faz mal, assim também não tenho

De estar sempre à espera que me deixem atravessar

A estrada

Fecho os olhos e a estrada já não existe

Assim, já não tenho de a atravessar.

De resto, podia ser pior…

Se ao menos o sonho não fosse um inútil…

Eu não teria de estar preso nas suas malhas!



João Tavares