quinta-feira, fevereiro 08, 2007

Prosa

Turbo

Escrevo nadas que se materializam em palavras. Deixam de ser nadas para passarem a ser banalidades. E o que me fere o entendimento é que estas banalidades, como todas as outras, são reais. Isto não devia ser assim. Na verdade, nem sequer é.
Recomecemos…
É que eu já falei em verdade, e esse é o primeiro passo para se chegar à conclusão de que se está a mentir.
Por outro lado, falar na mentira é falar da verdade negativa, porque a mentira é também um termo. Recomecei mal porque me dirigi para o oposto da verdade. E isso é nada. Bom… talvez não seja nada, porque se o fosse não estaria materializado. É já alguma coisa. É uma banalidade. Recomeçamos?

Mas como se recomeça nada? Ou melhor, como se recomeça a impossibilidade do nada? A impossibilidade arrasta-me para a verdade ou para a mentira, e o que eu quero é permanecer num meio-termo que seja nada. Esta é a impossibilidade. Porque o meio-termo é já alguma coisa. Quererei o paradoxo? É possível.
Este recomeço é preferível, pois recomecei no possível. O possível é alguma coisa, é todas as coisas simultaneamente. O possível, sendo todas as coisas, é diametralmente oposto ao impossível que é, aparentemente, coisa nenhuma. O que finjo que me enfastia é este facto de o impossível ser mais categórico do que o possível. O impossível é finito, extenso, paradoxalmente inteligível. O possível é, senão infinito, pelo menos superador. Mas se o impossível é coisa nenhuma e até paradoxal – embora apenas aparentemente – então convém aos intuitos do autor desta banalidade.
Convém, mas ainda assim, é alguma coisa. O impossível é-me conveniente, mas eu quero, teimosamente, o possível. Se quero o possível é porque me é conveniente, porque só queremos aquilo que nos é vantajoso. Eu não sei se é possível desejar a dor, porque se desejamos, é provável que essa dor a seja apenas para os outros e que nós estejamos, apenas e afinal, a dar provas concretas à ideia do Espectro Invertido de John Locke, que coloca a possibilidade de usarmos o mesmo conceito para coisas que vemos de modo diverso uns dos outros. Portanto, desejo algo, e isto é alguma coisa e não uma mera banalidade. Aquilo que desejamos pode ser uma banalidade. O acto de desejar, em si, não pode ser uma banalidade, pelo menos em termos consensuais, porque o mundo é, afinal, “apenas” isso, uma questão de consensos. Convém, neste momento, recomeçar esta banalidade, pois temo ter deixado de sê-la para intentar passar a falar de verdades. E eu não quero verdades. Também não quero impossibilidades. Quero o possível. Quero a possibilidade do paradoxo.

Ocorreu-me há instantes que a melhor forma de encontrar a possibilidade é escrever uma banalidade. Não encontramos neste texto nenhuma impossibilidade. Admito que encontrar um sentido a este texto seja muito pouco provável. Ainda assim, respeito o princípio de Heisenberg que me diz ser apenas muito pouco provável que alguém encontre um sentido neste texto. Não há, portanto, impossibilidade. Por outro lado, este mesmo princípio de Heisenberg impede-me de ter como certa a impossibilidade de haver impossíveis. Portanto, é possível que este texto seja impossível de compreender. Mas notem, é apenas possível…
Leonel Ferreira